Uma nova polêmica surge no horizonte científico das pesquisas médicas. Em três diferentes trabalhos científicos publicados recentemente na revista The New England Journal of Medicine, é exposto um conjunto de resultados que relacionam o consumo global de sódio e a ingestão e excreção urinária de sódio e potássio (que servem de estimativa de sua ingestão) com o risco de doença cardíaca e morte.
Já está bem estabelecido por estudos prévios que um aumento do consumo de sódio está associado com o aumento da pressão arterial, um dos principais fatores de risco para doença cardíaca. Estima-se que um bilhão de pessoas no mundo tenham hipertensão e que ela é responsável por 9 milhões de mortes por ano. Entretanto, os efeitos da ingestão de sódio sobre a mortalidade por doença cardiovascular, em termos globais, não eram conhecidos.
Em um dos trabalhos foi quantificada a ingestão global de sódio baseada em levantamentos de 66 países e, compilando os resultados de 107 pesquisas já publicadas por meio de uma ferramenta estatística chamada de meta-análise, foi estimado o efeito da ingestão de sódio sobre a pressão arterial e o efeito da pressão arterial sobre mortalidade cardiovascular. Os resultados apresentam uma robusta relação linear entre o consumo de sódio e eventos cardiovasculares (quanto maior a ingestão de sal maior é o risco de doença cardiovascular) e se estima que mais de um milhão e seiscentas mil mortes por doença cardiovascular em todo o mundo, no ano de 2010, podem ser atribuídas ao excesso do consumo de sódio.
As recomendações para prevenção de doenças cardíacas das principais sociedades de cardiologia pelo mundo estabelecem que a ingestão máxima de sódio não ultrapasse de 1,5 a 2,4 gramas por dia (o valor de referência é 2 g de sódio/dia). Estes valores representam em torno de 4 a 6 g de sal (o sódio corresponde a 40% do peso total do sal de cozinha e uma colher de chá contém próximo de 6 g de sal de cozinha, dos quais 2,4 g são de sódio).
Os outros dois trabalhos compõem um grande estudo que avaliou o consumo de sódio e potássio pela análise da excreção urinária diária destes eletrólitos em mais de 100 mil pessoas de 17 países. Este consumo foi relacionado com hipertensão arterial e o risco de morte por doença cardíaca.
Os resultados do efeito do sal sobre a pressão são claros em demonstrar que quanto maior o consumo de sal, maior é a pressão arterial. Os que já têm pressão alta e os mais velhos são mais sensíveis ao efeito do sal sobre a pressão. No que tange ao efeito do sal sobre mortalidade, também os hipertensos que ingerem mais sal apresentam maior risco. Nas pessoas de pressão normal, os que têm uma excreção de sódio maior, que corresponde a uma ingestão acima que 4 g/dia têm um risco de morte proporcionalmente maior.
E, para surpresa de muitos, as pessoas com uma excreção urinária que corresponde a uma ingestão de menos de 2 g de sódio por dia, também têm um maior risco de morte. Aparentemente existe uma janela de ingestão de sódio de 2 a 4 g/dia em que os riscos de morte são menores. Consumos tanto acima quanto abaixo destes valores aumentariam o risco.
O potássio, por sua vez, apresentou uma relação inversa entre excreção urinária e pressão arterial, assim como com risco de morte cardiovascular. Isto reforça uma postulação preconizada a algum tempo, que a relação entre as concentrações de sódio e potássio no organismo talvez seja mais importante que os seus valores individuais.
Os resultados deste estudo revelam outro dado interessante. Somente 10% dos participantes apresentaram uma excreção diária de sódio correspondente à ingestão diária preconizada, de 2 g/dia. Isto indica que parece ser muito difícil atingir os valores recomendados de ingestão diária de sódio, a despeito dos alertas e campanhas que são feitas neste sentido. Provavelmente isto se deve ao fato que em torno de 80% do sal que ingerimos diariamente provir de alimentos industrializados e não do nosso saleiro doméstico.
Muito bem, isto quer dizer que eu posso comer sal à vontade? Definitivamente não! Está muito claro, e confirmado por estes estudos, que a ingestão acima de certas quantidades é altamente prejudicial à saúde. Por outro lado, dietas altamente restritivas ao sal também podem ser prejudiciais. Principalmente se acompanhadas de uma baixa ingestão de potássio.
Reduzir a ingestão de alimentos industrializados ao mínimo e aumentar a ingestão de frutas, legumes e vegetais, compõe uma fórmula segura de manter um equilíbrio saudável entre sódio e potássio no organismo.
Autor: Dr. Gilberto Sanvitto - ABC da Saúde